WikiMini

Dilectissima Nobis

Dilectissima Nobis
Carta encíclica de Papa Pio XI
Brasão de Papa Pio XI
Ano 1935
Ano do pontificado XIII
Tradução do título Muito Querida para Nós
Tópicos abordados A opressão da Igreja na Espanha
Encíclica papal nº XXIII
Encíclica anterior Acerba animi
Encíclica posterior Ad catholici sacerdotii

Dilectissima Nobis é uma encíclica de Pio XI, datada de 3 de junho de 1933, publicada na Acta Apostolicae Sedis (vol. XXV, pp. 261-287) em latim e em espanhol, tratando sobre a situação injusta criada para a Igreja Católica na Espanha.[1]

Começa o papa a encíclica demonstrando seu amor por Espanha e a dor pela situação que a Igreja enfrenta naquele país:

Desde sempre, a nobre nação espanhola Nos foi sumamente amada por seus insignes méritos para com a fé católica e a civilização cristã, por sua tradicional e ardentíssima devoção a esta Santa Sé Apostólica e por suas grandes instituições e obras de apostolado, pois tem sido mãe fecunda de santos, de missionários e de fundadores de ínclitas ordens religiosas, glória e sustento da Igreja de Deus. E precisamente porque a glória da Espanha está tão intimamente unida com a religião católica, Nos sentimos duplamente entristecidos ao testemunhar as deploráveis tentativas que, desde há algum tempo, estão se reiterando para arrancar a esta nação tão querida a fé tradicional, os mais belos títulos de grandeza nacional.
— Inicio da Encíclica

Diante desses fatos, por meio do Núncio, insistiu-se junto ao governo que essas atitudes são incompatíveis com a concordância de espírito indispensável para a prosperidade de uma nação. A Lei de Confissões e Congregações Religiosas, recentemente aprovada, representa uma nova ofensa à religião, à Igreja e à liberdade civil sobre a qual se declara fundamentar o novo regime espanhol. Estes são os motivos que originam esta encíclica, sem que seja inspirada por aversão contra a nova forma de governo, pois nada tem a Igreja contra a forma republicana, como demonstram as numerosas concordatas firmados com as repúblicas que, após a Guerra Mundial, substituíram na Europa os anteriores regimes monárquicos.[2]

Não pode, pois, justificar-se, como se tem tentado, a nova lei na necessidade de defender a república, pois tanto a hierarquia como os católicos leigos, ou seja, a maioria do povo espanhol, estiveram afastados de atos de violência e qualquer tipo de desordem, aceitando o poder constituído.

Tão evidente aparece por tudo o que foi dito a inconsistência do motivo aduzido, que dá direito a atribuir a perseguição movida contra a Igreja na Espanha, mais que à incompreensão da fé católica e de suas benéficas instituições, ao ódio que “contra o Senhor e contra seu Cristo”[3] fomentam seitas subversivas de toda ordem religiosa e social, como por desgracia vemos que acontece no «México»  e na «União Soviética» .
— Encíclica Dilectissima Nobis, AAS vol. XXV, p. 264/277

Agravos da lei de confissões e congregações religiosas

[editar | editar código fonte]

A lei reafirma a separação do Estado e da Igreja, tal como já estabelece a nova Constituição Espanhola, mas aos danos que para a sociedade supõe essa afirmação se acrescenta o modo hostil com que a lei de confissões e congregações religiosas entende essa separação, chegando a negar à Igreja o direito comum e a liberdade que se promete e assegura para todos os cidadãos. Dessa forma, enquanto todas as opiniões

têm amplo campo para se manifestar, apenas a religião católica, religião da quase totalidade dos cidadãos, vê que é vigiada odiosamente na educação, e que se impõem obstáculos às escolas e outras instituições suas, tão beneméritas da ciência e da cultura espanhola. O mesmo exercício do culto católico, ainda em suas manifestações mais essenciais e tradicionais, não está isento de limitações, como a assistência religiosa nos institutos dependentes do Estado; as procissões religiosas, as quais necessitarão de autorização especial governamental em cada caso; a mesma administração dos Sacramentos aos moribundos, e os funerais aos falecidos.
— Encíclica Dilectissima Nobis, AAS vol. XXV, p. 266/279

Além disso, a faculdade de possuir é retirada da Igreja, por um lado declarando de “propriedade pública nacional” todos os bens - móveis e imóveis - de que dispunha, permitindo apenas - como uma concessão graciosa, sujeita a numerosos controles - o uso dos edifícios que se destinam ao culto, que, além disso - embora não sejam reconhecidos como de sua propriedade - estarão sujeitos às tributações inerentes ao uso dos mesmos.[4] Por outro lado, os bens que a Igreja possa adquirir no futuro só poderão ser mantidos na quantidade necessária para o serviço religioso.

Dessa forma, obriga-se a Igreja a submeter ao exame do poder civil suas necessidades para o cumprimento de sua divina missão, e o Estado laico se ergue como juiz absoluto do que é necessário para as funções meramente espirituais; e assim pode-se temer que tal julgamento estará em consonância com o laicismo que tentam a lei e seus autores.
— Encíclica Dilectissima Nobis, AAS vol. XXV, p. 267/280

A esses agravos se acrescenta a eliminação da atribuição ao clero que o Estado vinha satisfazendo em cumprimento de compromissos concordatários que não foram feitos por uma concessão gratuita, mas a título de indenizações por bens usurpados à Igreja. A isso se une que as Congregações ficam privadas do direito à educação e de qualquer atividade com a qual pudessem sustentar-se; mas, além disso, essas disposições

lançam sobre elas a injuriosa suspeita de que possam exercer uma atividade política perigosa para a segurança do Estado, e com isso se estimulam as paixões hostis da plebe a toda sorte de denúncias e perseguições: via fácil e expedita para persegui-las de novo com odiosas vexações.
— Encíclica Dilectissima Nobis, AAS vol. XXV, p. 268-269/282

O papa, após lamentar a expulsão da Companhia de Jesus, faz notar a ofensa que isso significa para o sumo pontífice, ao argumentar que a obediência da Companhia ao papa implica submeter-se a uma autoridade diferente da legítima do Estado; como se a autoridade do sumo pontífice, que lhe foi conferida pelo mesmo Jesus Cristo, pudesse impedir ou diminuir o reconhecimento das legítimas autoridades humanas, ou como se esse poder espiritual e sobrenatural estivesse em oposição com o do Estado.Por tudo isso

Diante de uma lei tão lesiva dos direitos e liberdades eclesiásticas, direitos que devemos defender e conservar em toda a sua integridade, acreditamos ser dever preciso de Nosso Apostólico Ministério reprovar e condenar a mesma. Por conseguinte, Nós protestamos solenemente e com todas as Nossas forças contra a mesma lei, declarando que esta não poderá nunca ser invocada contra os direitos imprescritíveis da Igreja.
— Encíclica Dilectissima Nobis, AAS vol. XXV, p. 272/285

Atitude que o papa espera dos católicos espanhóis

[editar | editar código fonte]

O papa termina, alentando os católicos da Espanha a que

Penetrados da injustiça e do dano de tais medidas, utilizem todos os meios legítimos que por direito natural e por disposições legais ficam ao seu alcance, a fim de induzir os mesmos legisladores a reformar disposições tão contrárias aos direitos de todo cidadão e tão hostis à Igreja, substituindo-as por outras que sejam conciliáveis com a consciência católica
— Encíclica Dilectissima Nobis, AAS vol. XXV, p. 272/285

Dessa forma, diante da ameaça dos danos que supõe a aplicação desta lei, pede que

deixem de lado os lamentos e recriminações, e subordinando ao bem comum da pátria e da religião todo outro ideal, unam-se todos disciplinados para a defesa da fé e para afastar os perigos que ameaçam a mesma sociedade civil.
De um modo especial, convidamos todos os fiéis a que se unam na Ação Católica, tantas vezes por Nós recomendada; a qual, mesmo sem constituir um partido, deve estar fora e acima de todos os partidos políticos, servirá para formar a consciência dos católicos, iluminando-a e fortalecendo-a na defesa da fé contra toda classe de insídias.
— Encíclica Dilectissima Nobis, AAS vol. XXV, p. 273/286

Conclui a encíclica confiando que a oração de tantos bons filhos, sobretudo no Ano Santo da Redenção que se está celebrando, seja acolhida benignamente por Deus; e nessa confiança transmitir a toda a Nação Espanhola a Bênção Apostólica.

  1. «Dilectissima Nobis». Vatican.va. 3 de junho de 1933. Consultado em 27 de outubro de 2023 
  2. Pio XI (1933). Dilectissima Nobis (em espanhol). Vaticano: [s.n.] 
  3. Pio XI (1933). Dilectissima Nobis. [S.l.: s.n.] 
  4. Art. 12 da Lei de Confissões e Congregações Religiosas